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Morreu Mariano Gago, o cientista que pôs a ciência na agenda política

José Mariano Gago, que enquanto ministro da Ciência de governos socialistas pôs a investigação científica na agenda política portuguesa, morreu na sexta-feira em Lisboa, de cancro. Tinha 66 anos. Desempenhou as funções de ministro da Ciência em dois governos de António Guterres, entre 1995 e 2002, e outros dois de José Sócrates, entre 2005 e 2011. Inspirador, sonhador, energético, líder, alguém que teve uma visão para a ciência e a cultura científica do país e, mais do que isso, a pôs em prática – foram palavras usadas na sexta-feira para o descrever. O corpo está em câmara ardente na Basílica da Estrela, em Lisboa, e segue às 12h de sábado para o cemitério de Pechão, no Algarve. Mariano Gago era físico de partículas. O seu percurso académico começa no Instituto Superior Técnico (IST), em Lisboa. Licenciado aí em 1971 em engenharia electrotécnica, Mariano Gago parte para Paris para fazer o doutoramento sobre a produção e transferência de energia. “Pouco depois, em 1972, tenho um mandado de captura da PIDE, fujo de Portugal (estava cá de férias) e organizo a minha vida pensando que nunca mais voltaria”, disse numa entrevista à revista Análise Social em Julho de 2011, já depois de ter deixado de ser ministro. “Venho a Portugal, é claro, depois do 25 de Abril de 1974, mas o meu trabalho é lá.” Quando termina o doutoramento, segue para a Suíça, para Genebra, onde fica o Laboratório Europeu de Física de Partículas (CERN). Como físico, trabalha então no campo da aceleração e colisão de partículas, das altas energias. “A partir de 1978-1979, começo a tentar voltar para Portugal. Nos anos seguintes, estou cá e lá”, disse na mesma entrevista. Casado com a socióloga Karin Wall, e já com uma filha, a viverem em Genebra, é convidado para presidir à Junta de Investigação Científica e Tecnológica (JNICT), que antecedeu a Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), a principal entidade de financiamento público da investigação portuguesa. O convite, em 1986, partiu do então secretário da Investigação Científica, Eduardo Arantes e Oliveira, num governo PSD de Cavaco Silva. Mariano Gago aceita e vem para Lisboa, ficando na JNICT durante três anos, até 1989. É no âmbito destas funções que organiza, em 1987, as Jornadas Nacionais de Investigação Científica e Tecnológica. Ainda hoje, essas jornadas – que reuniram em Lisboa a então pequena comunidade científica portuguesa para se apresentarem propostas de desenvolvimento da ciência no país e fazer uma reflexão sobre as políticas de ciência – estão na memória de muitos investigadores. Não só a comunidade científica era pequena, como muitos estavam lá fora. “Como presidente da JNICT, revelou-se como gestor de ciência. Aí começou a fazer política de ciência, a pôr a ciência na agenda política. Mostrou enormes qualidades de liderança”, sublinha Carlos Fiolhais, físico da Universidade de Coimbra e divulgador científico. Depois de sair da presidência da JNICT, Mariano Gago escreve o livro Manifesto para a Ciência em Portugal. “Este livro é um programa de governo para a ciência. E ele pôs em prática esse programa. Achava que Portugal era um país atrasado e que o atraso podia ser remendado com uma aposta na ciência”, refere ainda Carlos Fiolhais. Depois de 1989, quando deixa a JNICT, anda entre cá e lá. “Ainda temos um pé na Suíça, mas estamos a viver em Lisboa, ainda que eu passe tempo no CERN, como muitos outros físicos experimentais da minha área, especialmente na altura da preparação das experiências ou da aquisição de dados”, recordava à Análise Social. Depois, em 1995, é convidado para ministro da Ciência e Tecnologia. “Foi a primeira vez que existiu um ministério só para a ciência e a tecnologia e isso é uma mudança enorme em Portugal, da noite para o dia”, frisa Carlos Fiolhais. O que se segue é a criação de uma série de alicerces. Surge então a FCT, a sucessora da JNICT. É lançada a Ciência Viva – Agência Nacional para a Cultura Científica e Tecnológica, que tem hoje uma rede de centros pelo país e cujo ex-libris é o Pavilhão do Conhecimento, em Lisboa. “A Ciência Viva é uma das coisas mais inovadoras que Mariano Gago deixa. Uma agência como a Ciência Viva não existe em todos os países do mundo. Muitos cientistas estrangeiros perguntam-nos: ‘Vocês têm uma agência só para a cultura científica?’”, refere ainda Carlos Fiolhais. “O Pavilhão do Conhecimento tem actividades que atraem desde miúdos de três ou quatro anos até aos avós. É um legado de Mariano Gago”, diz também o investigador Alexandre Quintanilha, que é presidente do conselho científico do Pavilhão do Conhecimento. No legado de Mariano Gago está também a instituição da avaliação internacional da ciência que se faz em Portugal. “A avaliação internacional das unidades de investigação é dele. A FCT começa com o propósito de dar padrões internacionais à ciência portuguesa”, acrescenta Carlos Fiolhais. Uma herança também salientada por Alexandre Quintanilha: “Foi ele que começou a avaliação externa das instituições de investigação.”

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